Resumo de Eleições e Representação, artigo de Susan C. Stokes, Bernard Manin e Adam Przeworski para a Lua Nova – Revista de Cultura e Política. Boa leitura!
A alegação que conecta a democracia e a representação é que na democracia os governos são representativos porque são eleitos: se as eleições são concorridas livremente, se a participação é ampla, e se os cidadãos desfrutam das liberdades políticas, então os governos agirão em favor do interesse da população.
Representação é um tema de discussão porque os políticos têm objetivos, interesses e valores próprios, e eles sabem coisas e tomam decisões que os cidadãos só podem monitorar com certo custo. Mesmo se os políticos possam não querer fazer nada a não ser atuar a serviço do interesse público, para serem eleitos eles podem ter que, em primeiro lugar, satisfazer certos interesses. E uma vez eleitos, podem querer fazer outras coisas distintas de representar a população.
Neste artigo nós analisamos se os eleitores podem reforçar a representação, utilizando os seus votos para escolher políticos e políticas públicas, para sancionar o governante em exercício, ou para fazer ambos simultaneamente. Depois, discutimos as características institucionais que talvez contribuam para induzir representação.
A concepção da representação por mandato
A questão sobre a representação por mandato é (1) se as políticas dos governantes serão as mesmas de suas plataformas eleitorais, e (2) se seguir esta plataforma será melhor para os eleitores. As condições sob as quais a representação por mandato ocorre são de tripla natureza: quando os interesses dos políticos e dos eleitores coincidem, quando os políticos estão motivados pelo desejo de serem reeleitos e acreditam que os eleitores vão reelegê-los se eles realizarem políticas defendidas durante a campanha, e quando políticos estão preocupados com a credibilidade de suas futuras promessas. Estas três possibilidades levam à conclusão de que a representação por mandato ocorre quando as vontades dos políticos e dos eleitores coincidem, ou quando os políticos se preocupam apenas em vencer a eleição. Para vencer eles precisam prometer e implementar as propostas políticas que são melhores para o público.
Para clarear as debilidades do mecanismo de mandato, suponha-se que os políticos não possam ser reeleitos. Sem a punição de votar novamente, os eleitores precisam adivinhar quais partidos ou candidatos concorrentes têm preferências de políticas que coincidem com as deles e quais são impenetráveis à corrupção dominante no cargo. A menos que existam tais políticos, os candidatos vitoriosos não atuarão de maneira representativa.
Além disso, para serem eleitos, os políticos podem ter que fazer promessas a interesses específicos. Eles se preocupam apenas em ganhar eleições, mas, para vencer, para se apresentarem aos eleitores, precisam arrecadar fundos. Quando esses fundos vêm de interesses particulares, são trocas de favores. Os intercâmbios de contribuições políticas por favores de políticas geram distorções através de seus efeitos na distribuição de recursos.
Os políticos talvez se preocupem com o comprometimento a promessas como um investimento em suas credibilidades. Um político que se mantém fiel a suas promessas terá maiores possibilidades de o eleitor acreditar nele. Os eleitores querem que suas escolhas tenham conseqüências; portanto, eles desejam ser viável prever o comportamento dos políticos com base em suas plataformas políticas, retóricas e identidades. Os políticos podem argumentar que circunstâncias imprevisíveis são razões para eles se desviarem do mandato, mas têm que dar alguma explicação para fazê-lo.
Enquanto esses mecanismos de reputação podem encorajar os representantes a obedecerem às promessas eleitorais, uma característica surpreendente das instituições democráticas é que em nenhum sistema democrático os políticos são legalmente obrigados a manter suas plataformas. Uma vez que os cidadãos elegem os representantes, não há dispositivos institucionais que os forcem a cumprir suas promessas. As instituições devem permitir lidar com mudanças de condições. Os governos precisam ter alguma flexibilidade para enfrentar mudanças circunstanciais. Se os cidadãos esperam que as condições devem mudar e os governos são representativos, não vão amarrar os governos a suas instruções.
A concepção de representação por prestação de contas
Os governantes são controláveis mediante prestação de contas, caso os eleitores possam discernir se os governantes estão agindo em prol de seus interesses e caso possam sancioná-los apropriadamente, de tal forma que aqueles representantes que agirem em benefício do interesse dos cidadãos vencerão a reeleição e aqueles que não o fizerem, perderão. Representação por prestação de contas ocorre quando (i) os eleitores votam para reterem os representantes somente quando eles agem em favor do interesse dos primeiros, e (ii) o representante escolhe políticas necessárias para ser reeleito.
A visão padrão de como funciona o mecanismo de prestação de contas baseia-se no “voto retrospectivo”. Nesse enfoque, os cidadãos estabelecem algum parâmetro de desempenho para avaliar os governantes: “meu salário deve subir pelo menos quatro por cento durante o período”, “as ruas precisam ser seguras”, ou até mesmo “a seleção nacional precisa classificar-se para a Copa do Mundo”. Os cidadãos votam contra os representantes a menos que satisfaçam esses critérios. Por sua vez, o governo, esperando ser reeleito e antecipando a regra de decisão dos eleitores, fará o que for possível para satisfazer tais critérios. Assim, a prestação de contas induz à representação (Key, 1966).
Conclusão: a eleição como mecanismo de representação
Embora a democracia não possa assegurar a representação, é plausível, todavia, que a democracia leve mais à representação do que os regimes alternativos. Ainda assim, a conclusão desta análise deve ser que o controle dos cidadãos sobre os políticos é, no melhor dos casos, altamente imperfeito na maioria das democracias. As eleições não são mecanismos suficientes para assegurar que os governantes farão tudo o que puderem para maximizar o bem-estar dos cidadãos. Os governos tomam milhares de decisões que afetam o bem-estar individual. E os cidadãos têm apenas um instrumento para controlar essas decisões: o voto. Não é possível controlar milhares de metas com um instrumento.
O fato é que durante os últimos duzentos anos temos pensado pouco sobre o desenho institucional da democracia. Desde a grande explosão do pensamento institucional, quando as instituições democráticas atuais foram inventadas, não tem havido praticamente nenhuma criatividade institucional. A descoberta da representação proporcional na década de 1860 foi a última grande invenção institucional. Todas as democracias que emergiram desde o final do século XVIII apenas combinaram em diferentes formas, frequentemente peça por peça, as instituições preexistentes. Há, portanto, muito espaço para a criatividade institucional.
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Bibliografia:
MANIN, Bernard; PRZEWORSKI, Adam; STOKES, Susan C. (2006). Eleições e representação. Lua Nova, São Paulo, v. 67, p. 105-138.