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Uma Breve História do Brasil: Surge Um Novo Poder

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Resumo de Surge Um Novo Poder, capítulo de Uma Breve História do Brasil de Mary Del Priore e Renato Venâncio. Boa leitura!

Uma expressão bastante conhecida a respeito da proclamação da República é aquela proferida por ARISTIDES LOBO, dizendo que o povo assistiu à queda da monarquia “bestializado, atônito, sem conhecer o que significava”. De fato, a mudança da forma de governo, ocorrida em 1889, foi uma surpresa, um evento misterioso para os que não pertenciam ao grupo de conspiradores. No que diz respeito a seu repentino aparecimento, o novo regime deveu mais ao descontentamento nos quartéis do que à propaganda republicana.

A animosidade dos militares em relação à monarquia tinha raízes profundas. A GUERRA DO PARAGUAI acirrou ainda mais os ânimos, contribuindo para tornar pública a situação de abandono em que se encontrava o Exército brasileiro. O número de soldados alistados no ano do início do conflito é prova disso. Enquanto o Brasil, o mais rico e povoado participante da Tríplice Aliança, contava com 18 mil praças, o Paraguai possuía uma força armada de 80 mil homens.

Sempre que possível, dirigentes do Império procuravam reduzir os gastos do Ministério da Guerra, restringindo soldos e promoções. Além disso, era uma prática corrente transferir as tropas da corte ou das capitais provinciais para as zonas de fronteiras, o que era sentido como uma forma de degredo.

Essa política de enfraquecimento do Exército não era simplesmente resultado de uma conspiração de civis. O sistema escravista impunha pesadas limitações à formação de forças armadas modernas. A primeira razão disso consistia no fato de que, para ser realmente eficiente, o Exército dependia do desarmamento parcial ou total da sociedade. Ora, enquanto existiu escravidão no Brasil, desarmar a sociedade era impossível. Sem meios de autodefesa, os senhores ficariam à mercê da violência dos cativos. A existência desses últimos, por sua vez, também inviabilizava a formação de um Exército moderno pelo fato de não poderem ser considerados soldados confiáveis, pois não só desertavam na primeira oportunidade como também podiam voltar as armas contra os próprios oficiais. A escravidão tinha ainda outra implicação negativa: boa parte da população de homens livres, passível de ser recrutada, encontrava-se nas funções de capitães do mato e feitores, na vigilância e repressão aos escravos.

Além de fraco, o Exército brasileiro demorou para apresentar coesão interna em torno da oposição à monarquia. Um segmento importante dos oficiais era cooptado pelo sistema político monárquico. O melhor exemplo disso é o de Duque de Caxias. Herói da Guerra do Paraguai e comandante-chefe das forças imperiais, Caxias também foi um hábil negociador junto às elites que lideraram os movimentos regionais da época regencial, assim como ocupou cargo no Conselho de Estado, sendo por mais de uma vez deputado, senador, ministro e governador de província.

Ao longo da segunda metade do século XIX, os militares aristocratas foram se tornando cada vez mais raros, gerando uma situação que poderia ter consequências explosivas no relacionamento entre Exército e monarquia. Os motivos disso estavam relacionados às mudanças ocorridas nas forças armadas. A mais importante delas dizia respeito à extinção do sistema tradicional de recrutamento.

De acordo com as formas de seleção do Exército, herdadas do período colonial, os jovens bem relacionados ou oriundos de classes elevadas podiam ocupar altos postos sem preparação prévia ou tempo de serviço. Os pobres, ao contrário, permaneciam na condição de praças até dar baixa ou morrer. A reforma implementada em 1850 rompeu com essa tradição, estabelecendo critérios de promoção baseados na antiguidade e no desempenho nas zonas de combate. Essa mudança significou um dos primeiros passos rumo à profissionalização do Exército brasileiro.

A partir da nova lei, todos os que quisessem ocupar altas patentes deveriam começar em postos inferiores, sendo aos poucos promovidos. Tal exigência afastava os filhos das elites agrárias da carreira militar: as patentes baixas eram remuneradas com ínfimos soldos e vistas como indignas. A grande presença de negros e pardos nesses postos também afastava os jovens da elite, pois, eles deveriam enfrentar os oficiais que mantinham com as tropas uma relação não muito distante da de feitor–escravo, na qual o chicote era empregado como forma de punição.

Tal situação deu origem a uma elite que tinha por base o mérito. Outro efeito interessante das reformas foi a preocupação cada vez maior com o ensino científico. A novidade da segunda metade do século XIX foi a progressiva aplicação militar da ciência. Quanto a isso, uma vez mais cabe lembrar a importância da campanha do Paraguai, em que destacou-se a eficiência dos engenheiros militares no uso de balões tripulados para identificação das tropas inimigas, na confecção de mapas e na rápida construção de trincheiras, pontes e estradas. Contudo, a nova geração de oficiais não substituiu de uma hora para outra o grupo formado nas tradições aristocráticas. No interior do Exército havia diferentes grupos, uns mais, outros menos fiéis a d. Pedro II.

Para esses dois grupos, as décadas de 1870 e 1880 foram de grandes angústias e decepções. Dada a grande importância desempenhada pelos voluntários da pátria, muitos dirigentes do Império começaram a pregar contra a manutenção de uma força militar profissional numerosa. O risco de implementação de uma política de “enfraquecimento” voltou a pairar no ar. Assim, as questões militares, que antecederam a queda da monarquia, foram fruto não só de expectativas frustradas em relação aos salários e promoções ou da humilhação de oficiais obrigados a capturar escravos e a participar de violentas campanhas eleitorais, como também de uma atitude defensiva das forças armadas. O fortalecimento da Guarda Nacional na Corte, a transferência de comandos militares para províncias distantes, o drástico corte nos gastos do Ministério da Guerra, indicavam os riscos a que a instituição estava submetida.

A efervescência do movimento abolicionista, com seus “clubes” promovendo reuniões e manifestações, forneceu um modelo de organização que ia além dos quartéis e academias isoladas; a partir de 1887, nos clubes militares foi se formando um poderoso movimento de oposição à monarquia, que também estava sendo abandonada pelas elites agrárias.

Bibliografia:

DEL PRIORE, Mary e VENANCIO, Renato. Uma breve História do Brasil. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2010.

Rolf Amaro

Nascido em 83, formado em Ciências Sociais, músico, sempre ando com um livro na mão. E a Ana,minha senhora, na outra.

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