As Etapas do Pensamento Sociológico: Auguste Comte – A Sociedade Industrial

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Resumo de Etapas do Pensamento Sociológico – A Sociedade Industrial. Raymond Aron apresenta o pensamento de Auguste Comte. Bons estudos!

Auguste Comte recolheu no clima da época a convicção de que o pensamento teológico pertencia ao passado; que o pensamento científico comandaria daquele momento em diante a inteligência dos homens modernos; que com a teologia desapareceria a estrutura feudal e a organização monárquica; que os cientistas e os industriais dominariam a sociedade do nosso tempo. É importante compreender a escolha feita por Auguste Comte, entre as ideias correntes, para definir sua própria interpretação da sociedade da época.

O fato novo que chama a atenção de todos os observadores da sociedade, no princípio do século XIX, é a indústria. Os traços característicos da indústria, tais como os observam os homens do começo do século XIX, são:

1° A indústria se baseia na organização científica do trabalho. Em vez de se organizar segundo o costume, a produção é ordenada com vistas ao rendimento máximo.

2° Graças à aplicação da ciência à organização do trabalho, a humanidade desenvolve prodigiosamente seus recursos.

3° A produção industrial leva à concentração dos trabalhadores nas fábricas e nas periferias das cidades; surge um novo fenômeno social: as massas operárias.

As interpretações diferem conforme a importância atribuída a cada uma dessas características. Auguste Comte considera essas três como decisivas. A indústria se define pela organização científica do trabalho, que produz o crescimento constante das riquezas e a concentração dos operários nas fábricas; essa última característica é a contrapartida da concentração de capitais ou dos meios de produção nas mãos de um pequeno número de pessoas. Para ele, a oposição entre operários e empresários, é secundária. Resulta da má organização da sociedade industrial e pode ser corrigida por meio de reformas.

A versão de Augusto Comte da sociedade industrial não é nem liberal nem socialista. Ele acusa de metafísicos os economistas liberais que se interrogam sobre o valor e se esforçam por determinar, em abstrato, o funcionamento do sistema. A economia política começa pelo isolamento ilegítimo de um setor do todo social, que só pode ser compreendido rigorosamente no interior desse conjunto. Finalmente, Auguste Comte critica os liberais por superestimar a eficácia dos mecanismos de troca e de competição no desenvolvimento da riqueza.

A oposição essencial entre liberais e socialistas está no fato de que os primeiros acreditam na conciliação final dos interesses, e os segundos admitem o caráter fundamental da luta de classes. Auguste Comte, sobre este ponto essencial, está do lado dos liberais. Não acredita numa oposição fundamental de interesses entre proletários e empresários. Como os economistas liberais, Comte acha que o desenvolvimento da produção se ajusta aos interesses de todos. A lei da sociedade industrial é o desenvolvimento da riqueza, que postula ou implica a conciliação final dos interesses.

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Comte é hostil àqueles que chama de comunistas, isto é, os doutrinários ou teóricos do seu tempo, inimigos da propriedade privada. É um organizador que acredita nas virtudes da propriedade privada, e até mesmo nas virtudes da propriedade privada das riquezas concentradas. Para ele tal concentração é inevitável, o que significa, segundo sua filosofia da história, que é igualmente benéfica. A civilização material só se pode desenvolver se cada geração produzir mais do que é necessário para sua sobrevivência, transmitindo assim à geração seguinte um estoque de riqueza maior do que o recebido da geração precedente. A capitalização dos meios de produção é característica do desenvolvimento da civilização material, e leva à concentração.

Auguste Comte considera que a autoridade, econômica ou política, é sempre pessoal. Em toda sociedade são homens, em pequeno número, que comandam. Comte não crê que a substituição do regime de propriedade modificaria a estrutura da ordem social. São sempre os ricos que detêm a parte do poder que não pode deixar de acompanhar a riqueza. É bom que os homens que detêm o capital concentrado sejam os que exerçam a autoridade econômica e social indispensável.

Mas a propriedade pessoal deve ser esvaziada do seu caráter arbitrariamente pessoal, pois o que o ele chama de patrícios, os chefes temporais, industriais, banqueiros, devem conceber sua função como uma função social. A propriedade privada só é tolerável quando assumida, como o exercício de uma função coletiva por aqueles que a sorte ou o mérito pessoal designou para isso.

Comte assume, portanto, uma posição intermediária entre o liberalismo e o socialismo. É um organizador que deseja manter a propriedade privada e transformar seu sentido, para que, embora exercida por alguns indivíduos, tenha também uma função social.

Além dessa teoria da propriedade privada, Comte enuncia outra ideia que adquire importância, sobretudo em seu último livro, o “Système de politique positive”, isto é, a ideia do caráter secundário da hierarquia temporal.

O doutrinário do positivismo aceita a concentração da riqueza e a autoridade dos industriais porque a existência dos indivíduos não se define exclusivamente pelo lugar que ocupam na hierarquia econômica e social. O operário que se encontra embaixo na hierarquia temporal pode ocupar uma posição superior na hierarquia espiritual, se seu merecimento pessoal e devotamento à coletividade forem maiores do que os de seus superiores hierárquicos.

Essa ordem espiritual é uma ordem daqui deste mundo, mas que substitui a hierarquia temporal do poder e da riqueza por uma ordem espiritual dos méritos morais. O objetivo supremo de todos deve ser alcançar o primeiro lugar, não na ordem do poder, mas na ordem dos méritos.

A concepção comtista da sociedade industrial ficou como uma espécie de curiosidade, à margem da rivalidade entre as doutrinas. Nenhum partido político, da esquerda ou da direita, a tomou como fundamento.

Os temas comtistas fundamentais, o trabalho livre, a aplicação da ciência à indústria, a predominância da organização são bem característicos da concepção atual da sociedade industrial. Por que, então, Auguste Comte foi esquecido ou é desconhecido?

A primeira razão é que, embora as ideias principais do positivismo sejam profundas, sua descrição minuciosa da sociedade industrial se presta muitas vezes à ironia fácil. Comte quis explicar em pormenor a organização da hierarquia temporal, a posição exata dos chefes temporais, industriais e banqueiros. Quis precisar o número de habitantes de cada cidade, o número dos patrícios. Quis explicar como as riquezas seriam transmitidas. Em suma, traçou um plano preciso dos seus sonhos.

De outro lado, a concepção da sociedade industrial de Auguste Comte está associada à afirmação de que as guerras seriam anacrônicas. Ora, não foi o que se viu no período entre 1840 e 1945. Segundo Auguste Comte, a minoria ocidental não devia conquistar os povos de outras raças para impor-lhes sua civilização. Explicara que, se cometessem o erro de expandir sua civilização pelas armas, o resultado seria desastroso para todos. Durante todo um século os acontecimentos não estiveram de acordo com o que Comte havia anunciado.

Auguste Comte falou como profeta da paz porque acreditava que a guerra já não tinha função na sociedade industrial. A guerra tinha sido necessária para obrigar ao trabalho regular homens naturalmente anárquicos e preguiçosos, para criar Estados de grande extensão, para que surgisse a unidade do Império Romano, na qual se difundiu o cristianismo, e do qual surgiria finalmente o positivismo. No século XIX, porém, ela já não tinha nenhum papel a desempenhar: as sociedades eram definidas pelo primado e pelos valores do trabalho; já não havia uma classe militar, nem motivo para combater. As conquistas tinham representado, no passado, um meio legítimo, ou pelo menos racional, para os que se beneficiavam delas, de aumentar os recursos. Mas, numa época em que a riqueza depende da organização científica do trabalho, os ganhos de guerra perdem significado, se tornam anacrônicos.

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Bibliografia:

ARON, Raymond. As etapas do pensamento sociológico. 7ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.

Rolf Amaro

Nascido em 83, formado em Ciências Sociais, músico, sempre ando com um livro na mão. E a Ana,minha senhora, na outra.

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