Navegantes, Bandeirantes, Diplomatas: O Mapa da Colônia

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Resumo de Navegantes, Bandeirantes, Diplomatas – O Mapa da Colônia, nono capítulo da obra de Synesio Sampaio Goes Filho. Boa leitura!

9.1 Madri: um acordo favorável a Portugal?

Apesar da curta vigência formal, o Tratado de Madri é, na História do Brasil, o texto fundamental para a fixação dos contornos do nosso território. Foi o Tratado de Madri que legalizou a posse do Rio Grande do Sul, do Mato Grosso e da Amazônia, regiões situadas a ocidente da linha de Tordesilhas.

Ao se olhar um mapa do Brasil de hoje, tem‑se a impressão de que a Espanha cedeu muito: afinal, cerca de dois terços do território nacional são constituídos por terras extra‑Tordesilhas. A explicação corrente é que houve uma compensação global: no Oriente foi a Espanha quem legalizou a posse de regiões que seriam portuguesas pela divisão de 1494 (e acordos posteriores), como as ilhas Filipinas e Molucas. Tratou‑se, portanto, de um acerto mundial de contas. O argumento é, aliás, consignado no próprio texto do Tratado.

9.2 O desconhecido revelado

Agora, uma palavra sobre o homem que estava no comando das negociações do tratado na corte portuguesa: Alexandre de Gusmão, que não tem propriamente uma biografia escrita. Nossa visão é a seguinte: Alexandre de Gusmão é um português, nascido e criado na colônia americana, que revelou‑se um articulado e bem sucedido defensor dos interesses territoriais daquela parte do império luso que mais tarde seria o Brasil.

9.4 Alexandre de Gusmão

Nascido na “Villa do Porto de Santos”, como então se dizia, em 1695, Alexandre de Gusmão era de uma família conhecida localmente, mas de poucas posses. Com quinze anos, Gusmão vai a Lisboa, onde consegue proteção real, segundo alguns autores porque D. João V gostou de um poema do santista.

Alexandre é nomeado, em 1730, Secretário Particular de D. João V. Nesse mesmo ano, é feito membro do Conselho Ultramarino. Conhecia o Brasil como ninguém e sabia como era importante para Portugal assegurar‑se firmemente da colônia americana. Tomando posse de seu cargo, começa o trabalho, completado em 1750: acordar com a Espanha limites para o Brasil, de maneira que seu território incluísse todas as terras ocupadas pelos luso‑brasileiros.

9.5 Ideias criativas

No segundo quartel do século XVIII, houve um verdadeiro renascimento dos estudos geográficos, por estímulo direto da Coroa. O que queria o Governo português era ter ideia clara da localização dos territórios ocupados, em relação à linha de Tordesilhas, em especial depois dos recentes avanços no Centro‑Oeste (Mato Grosso). De sua parte, a Espanha nada fez, ou quase nada.

Listemos as proposições sobre as quais se assenta o tratado assinado em 1750: Portugal ocupou terras na América, mas a Espanha se beneficiou no Oriente; a origem do direito de propriedade seria a ocupação efetiva do território; e, em casos excepcionais, poderia haver troca de territórios.

9.6 Madri: negociações

O que Portugal buscava era negociar um tratado que conservasse a Amazônia e o Centro‑Oeste e criasse, no Sul, uma fronteira estratégica que vedasse qualquer tentativa espanhola nessa região, onde a balança de poder pendia para Buenos Aires. Já para a Espanha, o alvo primeiro era parar de vez a expansão portuguesa; depois, reservar a exclusividade do estuário platino, evitando o contrabando da prata dos Andes, que passava por Colônia; e, finalmente, com a paz proporcionada por um acordo, impedir que a rivalidade peninsular na América fosse aproveitada por nações inimigas de Madri, numerosas na Europa, para aí se estabelecerem.

Pouco a pouco foi‑se precisando a descrição das fronteiras, o que pode ser perfeitamente acompanhado pela leitura das pormenorizadas cartas que Alexandre de Gusmão enviava ao negociador português em Madri. Os limites que emergem dessas cartas são basicamente os que figuram no próprio Tratado.

Logo depois, no começo de 1749, Gusmão despacha, para servir de apoio visual às negociações, uma carta geográfica na qual estavam desenhados os limites propostos nas negociações. É o primeiro mapa do Brasil, com a forma quase triangular hoje familiar a todos, conhecido como Mapa das Cortes. Nesse mapa, a área extra‑Tordesilhas do Brasil era bastante diminuída, o que dava a impressão de haver parcos ganhos territoriais. Aceito por ambas delegações, foi a base tanto para a negociação final, quanto para as posteriores campanhas de demarcação.

O Tratado de Madri foi assinado em 13 de janeiro de 1750. Legalizava‑se, assim, a ocupação da Amazônia, do Centro‑Oeste e do Sul do Brasil e se abandonava o antigo sonho platino.

9.7 O Tratado de Santo Ildefonso

Vários são os motivos que levaram à anulação do Tratado de Madri. A deterioração das relações entre as Coroas, provocada, na Espanha, pela ascensão, em 1760, de Carlos III, um opositor do acordo, e, em Portugal, pela consolidação do poder de outro, o Marquês de Pombal, foi seguramente causa importante da rápida morte do acordo. Pombal era contra o Tratado de Madri porque não concordava com a cessão da Colônia do Sacramento.

O fato é que, em 1761, os dois países assinaram o Tratado de El Pardo, pelo qual o Tratado de Madri e os atos dele decorrentes ficavam cancelados e era criada uma pausa durante a qual se esperaria o momento propício para novo ajuste de limites.

E esse momento surgiu em 1777, ano no qual D. Maria I sobe ao trono e inicia a política de reação ao pombalismo, que ficou conhecida como “viradeira”. A Espanha fez exigências e impôs a assinatura de um Tratado Preliminar de Limites, que ficou com o nome de Santo Ildefonso. Por esse tratado, Portugal conservava para o Brasil as fronteiras oeste e norte negociadas em Madri. Cedia, entretanto, a Colônia do Santíssimo Sacramento, sem receber a compensação dos Sete Povos das Missões; o Rio Grande do Sul acabava, pois, numa frágil ponta e tinha apenas a metade de seu território atual.

9.8 A incorporação dos Sete Povos

A Revolução Francesa, primeiro, havia unido as potências peninsulares, que até participaram de uma invasão conjunta no sul da França; mas, depois, quando Madri aderiu a Paris, em 1795, separou‑as perigosamente para Portugal.

Por exigência do Primeiro‑Cônsul Napoleão Bonaparte, a Espanha invade Portugal com o objetivo de impedir que navios ingleses frequentassem portos portugueses, nessa quadra do bloqueio continental. A guerra foi rápida (maio e junho de 1801), mas teve consequências importantes na América: os luso‑brasileiros, menos com tropas regulares, mais com voluntários gaúchos, invadiram a região dos Sete Povos, aproveitando‑se da situação precária em que estes se encontravam, após a expulsão dos jesuítas. E, assim, em poucos dias, um feito de enorme significado para a formação territorial do Brasil foi realizado com diminuta intervenção oficial. Conquistado o território, daí, sim, houve esforço do Governo para ocupar a área, distribuindo terras e atraindo colonos.

A guerra de 1801, terminou nesse mesmo ano com a assinatura da Paz de Badajós. Nada dispôs o acordo sobre a América, e por isso a antiga área dos Sete Povos (maior que Portugal) continuou na posse dos luso‑brasileiros.

O fato importante a reter é que, ao se encontrar o Brasil independente e cercado por dez vizinhos, se não havia propriamente acordos de fronteira, havia, sim, uma ideia geral dos limites do território nacional que vinha dos grandes tratados coloniais: afinal, nosso mapa de hoje é praticamente o Mapa das Cortes, este, sim, o inventor do Brasil.

Bibliografia:

GOES FILHO, Synesio Sampaio. Navegantes, bandeirantes, diplomatas: um ensaio sobre a formação das fronteiras do Brasil. Brasília: FUNAG, 2015.

Agradecemos à Patrícia Derolle, do E-Internacionalista, pela dica.

A íntegra da obra pode ser acessada aqui.

Rolf Amaro

Nascido em 83, formado em Ciências Sociais, músico, sempre ando com um livro na mão. E a Ana,minha senhora, na outra.

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